“Os britânicos não fornecem informações úteis sobre as partidas de pequenos barcos ou fornecem informações muito gerais que não foram verificadas”, refere um relatório hoje publicado pelo Tribunal de Contas francês, órgão responsável pela auditoria da utilização de fundos públicos, e que é independente face ao Governo e ao parlamento.
As informações sobre as circunstâncias em que os migrantes chegam ao Reino Unido, as suas nacionalidades e barcos utilizados “parecem muito irregulares”, afirma o relatório, acrescentando que “a relação entre a França e o Reino Unido é, portanto, desequilibrada em termos de troca de informações”.
O relatório refere-se a uma unidade conjunta de inteligência criada em 2020 para combater o tráfico de seres humanos e reduzir o número de pessoas que arriscam a vida para atravessar ilegalmente o Canal da Mancha.
Esta unidade ajudou, em 2022, a desmantelar sete redes de migração ilegal.
Segundo o relatório, no ano 2022 não houve nenhum aumento, face ao ano anterior, do número de tentativas de atravessar o Canal da Mancha de barco foram evitadas, tendo-se mantido nas 56%.
No entanto, o Ministério da Defesa do Reino Unido estimou que as travessias aumentaram pelo menos 58% entre 2021 e 2022, um ano em que mais de 45.000 migrantes foram detidos nas costas britânicas.
O Governo britânico anunciou esta semana que o número de migrantes que atravessam o canal caiu mais de um terço em 2023, para cerca de 26.000 pessoas, tendo o Ministério do Interior adiantando, na quarta-feira, que outras 26.000 “tentativas de travessia perigosas, ilegais e desnecessárias foram evitadas em 2023 graças à parceria com a França”.
Nos últimos anos, a França intensificou os esforços para impedir que os migrantes atravessassem o Canal da Mancha, nomeadamente reforçando a polícia, equipamento e instalações.
O país recebeu 222 milhões de euros do Reino Unido entre 2018 e 2022 como parte do acordo bilateral e o primeiro-ministro britânico, Rishi Sunak, prometeu, em março passado, mais 541 milhões de euros para o período 2023-2026.
O número de pessoas que vive ilegalmente em França é desconhecido, mas investigadores do Pew Research Centre (um centro que fornece informações sobre questões, atitudes e tendências no mundo) estimaram que os números em 2017 estivessem entre 300.000 e 400.000, num país de 67 milhões de habitantes.
Isto representa cerca de três vezes menos migrantes irregulares do que no Reino Unido e na Alemanha.
O relatório do Tribunal de Contas também avaliou uma série de outras questões relacionadas com as políticas de imigração ilegal, que foram sujeitas a 133 alterações legislativas na última década.
Apontou a dificuldade de colocar em prática ordens de saída do território nacional, apesar de a França realizar o maior número de deportações na União Europeia.
Mais de 150.000 destas decisões foram tomadas em 2022 mas apenas 10% das pessoas saíram realmente do território, relata o tribunal.
Numa altura em que se debate a aprovação de uma lei sobre imigração que se centra sobretudo em formas de acelerar os processos de deportação, o relatório afirma que “as comparações internacionais sugerem que uma mudança de escala não é realista” no que diz respeito a tais políticas.
De acordo com estatísticas recolhidas pelo Ministério do Interior francês, o Reino Unido deportou cerca de 3.500 pessoas em 2022 e a Alemanha cerca de 13.000 pessoas.
As razões apontadas no relatório incluem a dificuldade das autoridades francesas em provar a identidade dos migrantes em causa, a relutância dos países de origem em emitir autorização para os deixar entrar e a recusa das companhias aéreas comerciais e dos pilotos de avião em levá-los a bordo.
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