O Governo apresentou, na terça-feira, a proposta de Orçamento de Estado para 2024 (OE2024), que revê em alta o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) em 2023, de 1,8% para 2,2%, e em baixa de 2,0% para 1,5% no próximo ano.
A proposta – que será discutida e votada na generalidade nos dias 30 e 31 de outubro, estando a votação final global agendada para 29 de novembro – mereceu críticas dos outros partidos, tendo inclusive o PCP e a IL já anunciado que votarão contra a proposta do Governo.
Mas, se fosse a oposição a apresentá-la, seria a proposta assim tão diferente da que conhecemos ontem?
A redução de impostos e medidas para facilitar o acesso à habitação e à saúde estão entre as prioridades dos outros partidos, que irão agora fazer propostas de alteração ao documento.
Veja, ponto por ponto, quais seriam as medidas dos partidos, da Esquerda à Direita, se fossem eles a elaborar o Orçamento do Estado para 2024:
Carga fiscal (ainda) mais baixa
Apesar da anunciada redução do IRS, o PSD alertou que o relatório do Orçamento do Estado para 2024 refere que a carga fiscal vai subir de 24,9% do PIB para 25,2% “apenas em termos dos impostos”.
Questionado se a redução do IRS proposta pelo Governo – com descidas nas taxas dos cinco primeiros escalões – não vai além da que propunha o PSD (cerca de 1.200 milhões de euros, mas com redução das taxas até ao oitavo escalão) o líder parlamentar do PSD, Joaquim Miranda Sarmento, considerou que está “em linha” e vem “a reboque” da proposta social-democrata.
“Saudar que o Governo tenha seguido aquilo que foi a proposta do PSD de redução do IRS. O que não é compreensível – além da reação que o PS teve em agosto, criticando a proposta do PSD como impossível, irresponsável – é porque é que o Governo não reduz já em 2023, dado o excesso de receita fiscal que prevê cobrar a mais em relação ao inicialmente previsto”, acusou.
Já André Ventura, do Chega, assinalou que o documento apresentado ontem não contempla qualquer forma de redução da carga fiscal sobre as empresas, que, alegou, permitiria o pagamento de salários mais altos.
O CDS, por sua vez, defendeu a redução de 2% da tributação em todos os escalões do imposto, a dedução à coleta do aumento das taxas de juro, ou seja, compensando no IRS a pagar o que os contribuintes suportaram a mais com a subida das taxas de juro, e ainda uma majoração de 0,3% por cada filho no denominado IRS Familiar.
Recorde-se que, no final de setembro, cinco propostas do PSD para “aliviar a asfixia fiscal” foram chumbadas no Parlamento. O partido propunha uma diminuição de 1.200 milhões de euros no IRS, através da redução das taxas marginais, mas o PS votou contra e inviabilizou a medida.
Na ótica do PCP, a dedução específica do IRS deveria passar a ser definida por uma fórmula indexada ao Indexante de Apoios Sociais (IAS), acompanhando assim a taxa de inflação. No âmbito do alívio da carga fiscal das famílias, os comunistas sugerem a reposição do IVA de 23% para 6% na eletricidade e no gás natural, acrescentando o gás de botija. O mesmo imposto sobre as telecomunicações baixaria da atual taxa máxima de 23% para a taxa intermédia de 13%.
Isenção de IRS para os jovens até aos 30 anos
O PSD seria a favor da criação de uma taxa máxima de 15% de IRS para os jovens até aos 35 anos. Já o CDS insistiu numa “isenção de IRS para os jovens até aos 30 anos, uma medida muito mais ambiciosa que a apresentada agora pelo Governo”.
Nuno Melo insistiu ainda na “possibilidade de os juros do crédito à habitação poderem ser abatidos no IRS para ajudar as famílias com dificuldades de pagar as prestações mensais”.
E na habitação?
A habitação é das áreas que mais tem dominado o debate orçamental – e talvez das que conta com visões mais antagónicas por parte dos vários partidos.
O PSD defendeu “um programa de apoio aos jovens para a compra da primeira casa”; “a criação de um mecanismo que permita estabilizar o valor da prestação da casa até um máximo de cinco anos” e “um programa transitório de redução da tributação sobre o setor imobiliário”.
A Iniciativa Liberal (IL) opôs-se à ideia de limitar as atualizações das rendas e defende que a solução passa por tornar o mercado do arrendamento “mais atrativo”, prometendo propostas nesse sentido em sede de Orçamento de Estado.
O Bloco de Esquerda, por seu lado, defendeu que se proíba a venda de casas a não residentes e que se estabeleçam tetos máximos para as rendas. O partido até já apresentou 14 propostas de alteração ao pacote Mais Habitação – que vão desde a garantia de 25% de casas acessíveis nas novas construções ou a limitação da variação da taxa de esforço no crédito à habitação.
Teto máximo nas rendas, obrigar os bancos a baixar as taxas nos créditos à habitação, acabar com o regime de privilégio para os residentes não habituais, limitações no AL e segurança nos contratos de arrendamento: são as medidas que o Bloco apresentou e que o governo rejeita. pic.twitter.com/rB0a2nhGhe
— Bloco de Esquerda (@BlocoDeEsquerda) September 27, 2023
O Livre, que já tinha admitido que a crise na habitação será um dos temas que terá mais peso na altura de decidir o seu sentido de voto sobre a proposta do Governo de OE2024, prometeu apresentar, na especialidade, propostas para tentar conter a escalada dos juros.
Rui Tavares é a favor da criação de um fundo de emergência financiado com as vendas de imobiliário de luxo “a milionários não contribuintes e não residentes que procuram Portugal”, algo que não consta no orçamento. O líder do Livre pediu também a fixação das rendas e apoios às prestações, alimentados com lucros dos bancos.
Aumento dos salários
Sobre o aumento dos rendimentos, o Chega já anunciou que o partido vai entregar, em sede do OE2024, uma proposta de aumento salarial na ordem dos 15% e o pagamento de um 15.º mês isento de impostos, tal como propôs recentemente a Confederação Empresarial de Portugal (CIP).
Já o BE pretende o aumento do Salário Mínimo Nacional para os 900 euros em janeiro de 2024 e quer que este valor seja “atualizado ao longo do ano tendo em conta a inflação”.
Esta semana, o líder da IL tinha sublinhado “o esforço” dos parceiros que permite subir “um pouco mais” do salário mínimo. Ainda assim, disse que discutir se o Salário Mínimo Nacional é 810 euros de 820 ainda “são dados de uma enorme mediocridade”.
Também o PCP já tinha apontado que os aumentos salariais previstos ficam “muito longe” daquilo que as pessoas precisam.
“Aumentos de 15%, no mínimo de 150 euros e um aumento do salário mínimo nacional que se fixe nos 910 euros num caminho que durante o ano de 2024 chegue aos mil euros. Isso é que responde às necessidades e é isso tipo de aumentos que pode fazer diferença na vida das pessoas”, detalhou, no domingo, Paulo Raimundo.
IVA Zero continuaria
Inês de Sousa Real lamentou o fim da medida de IVA zero para um conjunto de bens alimentares e defendeu que o contexto económico “exigia medidas de continuidade nesta matéria”.
Na Saúde e Educação também há propostas – mas pouco consenso
A saúde é uma das áreas em que a IL deve insistir em sede de especialidade, depois de ter visto chumbada, na última semana, a sua proposta de uma nova lei de bases para esse setor que previa um “acesso universal” sem mais custos para os utentes e assente na liberdade de escolha e na concorrência.
O PCP deverá insistir numa das suas tradicionais bandeiras políticas: o aumento de 7,5% nas reformas e pensões em 2024, com um mínimo de atualização de 70 euros por pensionista, como contributo para a recuperação do poder de compra.
Além dessa questão, a bancada comunista vai avançar com propostas de alteração ao documento do Governo de António Costa para “garantir o direito à educação de qualidade”, como a gratuitidade das fichas de exercícios para todos os alunos do ensino obrigatório, o reforço da ação social escolar e as verbas para assegurar às escolas os recursos necessários.
Ainda à esquerda, o Bloco de Esquerda (BE) anunciou que as suas propostas orçamentais para o próximo ano se dirigem sobretudo à habitação, ao Serviço Nacional de Saúde (SNS) e ao aumento de salários, reconhecendo, porém, ter reduzidas expectativas sobre a abertura negocial do Governo.
De acordo com o calendário já aprovado pela conferência de líderes parlamentares, a proposta do Orçamento do Estado para 2024 é discutida na generalidade nos dias 30 e 31 de outubro.
As discussões na especialidade – onde são debatidos e votados quer os artigos da proposta do OE2024, quer todas as propostas de alteração e aditamento entretanto entregues pelos partidos – vão decorrer de 23 a 29 de novembro, culminando com a votação final global do documento.
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